terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Piscina de ‘cimento’

13/01/2015 - O Globo

O vazamento de um produto químico semelhante a cimento, ontem, na esquina das ruas Barão da Torre e Farme de Amoedo, em Ipanema, assustou moradores. O material jorrou de buracos no solo, como pequenos chafarizes. Representantes da Linha 4 do metrô disseram que não há risco para os prédios. O vazamento de um produto químico injetado para facilitar as escavações da Linha 4 do metrô, no início da tarde de ontem, na esquina das ruas Farme de Amoedo com Barão da Torre, em Ipanema, voltou a deixar moradores apreensivos com o futuro da obra. Apesar de ter a aparência de cimento, o Consórcio Linha 4 Sul, responsável pela obra, garantiu que se trata de polímero, composto utilizado na indústria. As duas ruas tiveram que ser interditadas por cerca de duas horas e meia, para que equipes pudessem evitar o avanço do material químico. Um carro-pipa também foi usado para ajudar na limpeza. O incidente ocorreu a cerca de 43 metros de distância de onde, em maio do ano passado, um afundamento de solo resultou em duas crateras e na interrupção do uso do chamado tatuzão, equipamento utilizado para perfuração do terreno. Desta vez, também segundo o consórcio, não houve necessidade de paralisação porque não há risco para as edificações próximas. As causas do problema, porém, ainda não foram divulgadas. E, para quem vive no bairro, o clima é de insegurança.

— A população não foi ouvida desde o início, e agora estamos apavorados com a possibilidade de um acidente mais grave. As explicações dadas pelo consórcio não nos convencem. Um dos pontos que questionamos é a própria profundidade das escavações que, por padrões internacionais, teria de ser de no mínimo 25 metros, mas chegará a 12 na Praça Nossa Senhora da Paz — reclamou a presidente do Projeto de Segurança de Ipanema, Maria Ignez Barreto.

O consórcio não comentou a questão da profundidade, mas reforçou em nota que "não há qualquer risco para as edificações do entorno e a escavação segue normalmente", com toda a área afetada já cercada e limpa.

O jornalista Chico Júnior flagrou o momento em que o produto químico começou a jorrar. Em menos de 30 minutos, toda a esquina e boa parte das duas ruas já estavam cobertas pela lama.

— Estava passando, por volta das 14h, e vi quando aquele líquido começou a jorrar. Era apenas um, mas logo cinco buracos apareceram, ao lado do canteiro de obras. A lama foi cobrindo a rua, e muitos operários correram para ver o que acontecia. Estavam sem saber o que fazer, meio assustados — contou Chico Júnior, que registrou as imagens num vídeo enviado ao GLOBO.

As cenas de ontem assustaram Aires Henrique, que trabalha em um prédio próximo à obra. Ele também se mostrou preocupado com a situação:

— Como estou sempre aqui, fico um pouco receoso. Esta obra não sai deste ponto. Dá um pouco de medo andar nas proximidades. A insegurança é grande. Você vê cartazes nas janelas de alguns apartamentos próximos com os dizeres "SOS Obra do metrô".

A advogada Silvia de Almeida mora há pouco tempo no bairro e presenciou os incidentes.

— Dois problemas graves em um curto espaço de tempo. Por mais que eles neguem risco às estruturas dos prédios, ficamos com medo. A sensação é de estar em um campo minado — desabafou.

CREA TAMBÉM DESCARTA RISCO

Horas após o vazamento ter ocorrido, o vicepresidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio (Crea-RJ), Manoel Lapa, que vem acompanhando as obras desde o ano passado, esteve no local para tentar esclarecer melhor o incidente. Segundo ele, o produto que vazou seria utilizado para facilitar, lubrificar a passagem do tatuzão:

— Antes da passagem do tatuzão, são colocadas colunas de uma calda de cimento, que é enrijecida e serve para tornar o solo que vem à frente mais uniforme. Depois, é colocado esse produto químico que facilita a passagem do tatuzão. Por algum motivo ainda não determinado, esse material conseguiu se infiltrar em algum caminho no cimento e chegou até a superfície.

Lapa também foi a alguns prédios vizinhos ao vazamento e confirmou que não há nenhum risco aparente às edificações. Ele comentou ainda que nos trechos onde as escavações ocorrerão além dos 25 metros de profundidade estão sendo feitos reforços de concreto nas laterais, para que os edifícios não sejam afetados.

O local de onde vazou o material foi cercado por lonas, onde as equipes fizeram a quebra do asfalto com britadeiras. Uma corrente foi instalada na área atingida para evitar que as pessoas atravessassem o local. Apesar disso, uma mulher chegou a afundar o pé no produto que vazou. Por volta das 16h30m, o trânsito foi liberado em meia pista para quem seguia da Rua Farme de Amoedo em direção à Barão da Torre. Além de problemas no trânsito, o acidente causou prejuízos ao comércio local.

— Por causa do vazamento, o movimento de clientes parou a tarde toda. Sem contar que eu precisei lavar toda a loja — reclamou a funcionária de uma lanchonete de Ipanema.

Em nota, a Secretaria estadual de Transportes afirmou que fiscaliza permanentemente as obras da Linha 4 através da empresa Riotrilhos, que mandou engenheiros ao local. "Foi executado o plano de emergência, que prevê o monitoramento das edificações, medidas técnicas de controle do vazamento e acionamento de autoridades", informou. A secretaria também pediu ao consórcio um laudo com as causas do incidente, mas reforçou que não há riscos.

INCIDENTE PARALISOU O TATUZÃO POR 6 MESES

Em 12 de maio do ano passado, a Defesa Civil do Rio determinou a suspensão das escavações feitas pela Tunnel Boring Machine, mais conhecida como tatuzão, após o surgimento de duas crateras na calçada da Rua Barão da Torre, entre as ruas Farme de Amoedo e Teixeira de Melo, em Ipanema. Na madrugada do dia anterior, moradores do trecho foram acordados por um estrondo. O incidente, que teria ocorrido devido ao assentamento do solo no local, causou pânico entre moradores, que deixaram seus apartamentos às pressas, com medo de desabamento. Quatro edifícios tiveram rachaduras, e guaritas foram danificadas. Um dos mais atingidos foi o prédio 137. Não houve feridos. Também não houve interrupção do restante das obras para a implantação da Linha 4 do metrô, que ligará Ipanema à Barra da Tijuca.

Em 27 de maio, técnicos do Consórcio Linha 4 Sul, responsável pelas obras, reuniram-se com os moradores para informar que seriam realizadas, a partir do dia 28 e durante 60 dias, injeções de calda de cimento no subsolo, para recuperar as características que o terreno apresentava antes do incidente.

No entanto, apenas em 10 de novembro o tatuzão voltou a fazer escavações na Rua Barão da Torre. Logo após a máquina entrar em operação, por volta das 9h, um novo buraco, com cerca de meio metro de diâmetro, surgiu na rua, na altura do número 82, na calçada da Escola Municipal José Linhares.

Na ocasião, o consórcio negou que houvesse "qualquer relação entre as obras e o surgimento do buraco na Rua Barão da Torre", atribuído a um "vazamento de esgoto numa rede de 150 mm de PVC" da Cedae, que resolveu o problema.

A previsão é que a Linha 4 seja entregue no primeiro semestre de 2016.Serão seis estações em 16 quilômetros de extensão.

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