Novo trem do metrô chega e já impõe barreiras à acessibilidade

24/08/2012 - O Globo

O Globo percorreu estações onde o desnível entre a plataforma e a composição chega a um palmo, o que pode ser um sério obstáculo para cadeirantes

Na estação Maracanã, o desnível entre o piso trem e a plataforma chega a um palmo Pablo Jacob / Agência O Globo

RIO - Depois de oito meses de atraso na entrega da primeira composição, o novo trem do metrô começa finalmente a circular neste sábado. Mas, depois de tanta espera, os passageiros terão que aguardar um mês para usar o novo trem na hora do rush devido à fase de testes, na qual a operação será das 10h às 15h e das 21h à meia-noite. A viagem inaugural desta sexta-feira, da qual a população não participou, foi exclusiva para autoridades do governo e imprensa. A composição saiu da Estação Estácio, foi até o Maracanã e, em seguida, recebeu os primeiros passageiros, de onde seguiu viagem para a Pavuna. Durante a viagem entre as estações do Maracanã e de Botafogo, a equipe do GLOBO observou uma característica preocupante nos novos trens para pessoas com deficiência física: um grande desnível entre a plataforma e o vagão. Nas estações Maracanã, Cidade Nova e Flamengo, a altura chega a um palmo ou cerca de 22 centímetros.

O presidente da Metrô Rio, Flávio Almada, minimizou o problema, dizendo que há um sistema eletrônico nos trens que permite que, ao chegarem às estações, não haja o desnível. Almada acrescentou que o próprio peso dos passageiros faria os trens cederem e atingirem o nível da plataforma. Mas não foi isso que o O GLOBO constatou. Ao parar em algumas estações, mesmo com passageiros dentro, o desnível permaneceu.

O engenheiro mecânico e de segurança do trabalho Jaques Sherique, diretor do Clube de Engenharia, recebeu com surpresa a denúncia do GLOBO, já que na última quarta-feira ele e mais quatro engenheiros vistoriaram, a convite do Crea-RJ, o funcionamento das composições chinesas.

É inaceitável uma distância dessa não só para cadeirantes como para pessoas idosas. Quando há muita gente na porta dos vagões, quem embarca não costuma olhar para o chão. E sabemos que 80% dos acidentes no metrô ocorrem entre a plataforma e o metrô. Com certeza, com esse desnível, teremos mais acidentes.

Sherique afirmou que o Crea aguarda um relatório das 54 plantas de todo o metrô para emitir um parecer final em até cerca de 30 dias

Isso certamente terá um peso para o Ministério Público.

Segundo a assessoria de imprensa do Metrô Rio, a operação assistida, realizada nos primeiros 30 dias a partir de amanhã, vai ajustar as falhas, incluindo essa encontrada pelo GLOBO, já que o trem possui um sistema de regulagem, que vai nivelar a altura entre a plataforma e os vagões.

Apesar do aumento de 63% da frota, Almada admitiu que o primeiro trem não atenderá, por enquanto, ao que ele chamou de massa crítica, a população que usa o transporte nos horários do rush, mas disse estar otimista para os próximos meses:

Em dezembro, já teremos 10 trens em operação, quando será verão e haverá muito mais conforto. Hoje nós estamos transportando 700 mil pessoas. A partir de março, poderemos ofertar 1 milhão e 200 mil lugares. Essa oferta já é suficiente para as Olimpíadas afirmou Almada, acrescentando que os novos trens possuem capacidade de saturação até 2025.

O governador Sérgio Cabral afirmou que este é um dos legados que o Rio precisava para os Jogos Olímpicos. Durante o evento, Cabral fez dois anúncios: a aquisição de um empréstimo com o Banco Mundial, no próximo dia 5 de setembro, no valor de 600 milhões de dólares, para a aquisição de 60 trens para a SuperVia. E o início das obras da linha 3 do metrô, que ligará Niterói a São Gonçalo, em janeiro de 2013.

Com os BRTs da prefeitura, teremos quase 70% da população da região metropolitana andando em transporte de massa. É uma mudança radical na vida das pessoas.

Menos assentos para mais passageiros

Os carros dos novos trens têm menos assentos do que os antigos para dar mais espaço a passageiros em pé. As composições atuais possuem carros com 38 , 42 e 48 lugares. As atuais contam com 38 lugares em cada vagão e capacidade para 1.800 pessoas.

A menor quantidade de assentos incomodou a promotora de vendas Ana Maria Teixeira, de 48 anos, que foi em pé de Vicente de Carvalho até Botafogo. Para ela, com mais pessoas em pé, o desconforto nas horas do rush poderá ser maior.

É complicado porque, quando ficar cheio, como as pessoas vão sentar? Vão ficar várias em pé, sem ter como todo mundo segurar em alguma coisa e, assim, vai ficar um passageiro em cima do outro.

A gaúcha Dilaine Weber, de 42 anos, está de férias no Rio e experimentou tanto o antigo quanto o novo trem nesta sexta-feira e aprovou a temperatura, em torno dos 23ºC, mas criticou a diferença na quantidade de assentos.

Meu marido tem problema sério de coluna e está aqui, em pé. Minha mãe, que é idosa, está pegando o metrô, visitando outros bairros, e pode não encontrar lugar. Nesse sentido, acho que (o transporte) piorou.

Para o aposentado José Carvalho Andrade, de 70 anos, o espaço maior para os passageiros torna a viagem mais confortável.

Para esse sistema, é necessário ser dessa forma mesmo.

O presidente da concessionária afirmou que o novo layout interno dos trens - com bancos dispostos em forma longitudinal, para possibilitar mais passageiros em pé - é um padrão mundial.

É normal você ficar 15 minutos em pé em qualquer transporte de massa. Não é para percurso curto. As pessoas realmente não ficam sentadas.

Cabral rebate críticas ao traçado da Linha 4

O governador rebateu, ainda, as críticas de especialistas na área de transporte, feitas durante o seminário X Rio de Transporte, em relação ao traçado da Linha 4, que, ligando a Ipanema à Barra da Tijuca, funcionará como uma extensão da linha 1.

Se você for a estações de metrô do mundo inteiro, vai ver linhas maiores do que essa. Do ponto de vista técnico, econômico e social, é a grande solução. Vamos acabar com a maior concentração de veículos de passeio do Rio de Janeiro, que é exatamente nessa linha Barra da Tijuca - Zona Sul.

A assessoria de imprensa do Governo do Estado informou que não há possibilidade de o traçado da linha 4 voltar ao original, que sairia do Largo da Carioca, passando pelos bairros de Laranjeiras, Botafogo (Dona Marta), Humaitá, Jardim Botânico e Gávea.

Na quinta-feira, o presidente do Crea-RJ, Agostinho Guerreiro, disse que o funcionamento das composições chinesas acontece, aparentemente, de forma regular. Guerreiro e uma equipe ligada à Câmara de Análise de Prevenção de Acidentes da entidade fizeram uma vistoria na linha 1. As equipes buscaram verificar se as adaptações realizadas nas estações foram feitas de forma adequada. A ideia de fazer a análise surgiu após o Crea receber denúncias de que a concessionária reduziu o tamanho de plataformas e pilastras da linha subterrânea sem levar em conta algumas medidas de segurança.

O investimento nos 19 trens chineses foi de R$ 320 milhões, de acordo com o Metrô Rio. Segundo a concessionária, os bancos, dispostos de forma longitudinal, oferecerão mais espaço aos passageiros, que também poderão mudar de carro durante a viagem por meio das passagens sanfonadas (gangways). Todas as composições terão câmeras, e painéis de LED informarão o mapa das estações e orientarão o desembarque dos passageiros.

Em março de 2013, quando os 19 novos trens entrarem em operação, o MetrôRio operará com 19 composições na Linha 1 (114 carros) e 28 na Linha 2 (168 carros), com dois trens na reserva no Centro de Manutenção. Todos os trens terão seis carros. Com toda a frota em operação, a previsão é que os intervalos passem de seis para quatro minutos nas pontas de linha (entre Pavuna e Central, entre Saens Peña e Central e entre Ipanema/General Osório e Botafogo); e de três para dois minutos no trecho compartilhado (entre Botafogo e Central).

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