Estações fora dos trilhos

24/11/2012 - O Globo

Para especialistas, entradas do metrô destoam da paisagem ou foram descaracterizadas

Estação de metrô da praça General Osório, em Ipanema, é uma das mais criticadas por especialistas Domingos Peixoto / Agência O Globo

RIO - Qualquer comparação com Moscou ou Frankfurt é desleal, isso não se discute. Banhada a cobre e conhecida como palácio subterrâneo, a rede metroviária da capital russa remete aos gastos nababescos do governo Stalin. Já a cidade alemã conta com 86 estações que atendem a praticamente todos os seus bairros e mais parecem obras de arte. Mas mesmo longe da bagagem histórica do Velho Mundo, os acessos aos terminais do metrô carioca poderiam ser muito mais harmoniosos e integrados às belezas naturais da cidade. Essa é a avaliação de arquitetos e urbanistas ouvidos pelo GLOBO. Especialistas que elegeram a boca da Estação General Osório, inaugurada em 2009, como a representante de uma arquitetura totalmente fora dos trilhos.

Presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Sérgio Magalhães diz que a única coisa a unir as entradas de estações do metrô da cidade, principalmente as mais recentes, é justamente a ausência de qualidade.

As estações foram deteriorando à medida que o metrô foi avançando. As últimas que foram inauguradas são absolutamente incongruentes. É inaceitável que o Rio tenha em sua paisagem um elemento da natureza da estação General Osório. Uma contribuição totalmente negativa para a qualidade espacial e arquitetônica da cidade critica Magalhães.

Ele lembra que, nos anos 80, o interior de algumas estações tinham grande qualidade. Um exemplo eram as paredes com pastilhas de vidro da Carioca e do Largo do Machado, hoje totalmente descaracterizadas, depois de terem sido pintadas. As pastilhas foram aplicadas pela empresa Projeto Arquitetos Associados (PAAL), que atuou no metrô de 1968 a 1984. Aos 81 anos, o arquiteto Jayme Zettel, autor do projeto da Estação de Botafogo, diz que ela também foi modificada. Antes, a boca da estação não tinha cobertura. Mais um caso de descaracterização.

Essas estruturas foram colocadas para preservar as escadas rolantes. Não fazem parte do projeto original. E todas essas mudanças foram acontecendo sem que nos consultassem. As antigas estações foram projetadas com espaço contínuo, influência da escola de Oscar Niemeyer observa Zettel, confessando não gostar dos contornos dos novos modelos. Fico um pouco aflito com essas novidades. É até difícil falar sobre isso. Todo o material que selecionávamos nos projetos, em granito, mármore, era bastante durável. Hoje em dia, a qualidade é assustadora.

Reação semelhante tem o presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio (CAU-RJ), Sydnei Menezes. Ele diz que as estações carecem de um tratamento arquitetônico integrado à realidade urbana. Sydnei defende a realização de concursos para escolher os arquitetos que vão fazer os projetos das unidades das novas linhas de metrô:

Não que as estações tenham que ser todas iguais. A cidade é dinâmica, e a arquitetura reflete este dinamismo. Mas há de haver ao menos uma linguagem comum. As saídas da General Osório e da Rua da Alfândega (na Uruguaiana) são um horror; a da Cinelândia, idem. A Cardeal Arcoverde é a única onde houve uma integração interessante com a praça. O metrô deveria promover concursos públicos abertos a todos os arquitetos.

Menezes destaca os metrôs de Paris e Barcelona como os mais bem resolvidos na interação com o cotidiano:

Gosto dos metrôs tradicionais de Paris e Barcelona. Em Paris, eles incluem alguns elementos de modernidade, como os elevadores para atender aos portadores de deficiência. Nada disso compromete o resultado final, pelo contrário. Arquiteto serve exatamente para isso: aliar a arte de criar à técnica.

Arquiteto conselheiro do IAB, Ricardo Villar também faz observações contundentes. Para ele, as estações não seguem linhas arquitetônicas.

Falta bom gosto e capacidade. Uma empresa que faz o que fez, aquele horror no meio da Avenida Presidente Vargas (referindo-se à Estação Cidade Nova), nem precisa de muita análise afirma Villar.

Projeto da Linha 4 já com críticas

Desde 1978 no ramo, João Batista Corrêa, responsável pela concepção das estações Cardeal Arcoverde, Siqueira Campos, Cantagalo, General Osório e Cidade Nova, não faz juízo de valor sobre a cúpula da estação General Osório este projeto específico não é meu e, por questão ética, não posso comentar e lembra que a Cardeal Arcoverde foi premiada, à época da inauguração, pelo IAB.

É preciso levar em consideração que há muitos entraves que fazem com que os projetos não sejam executados totalmente de acordo com o que imaginamos. Os métodos construtivos das estações são totalmente diferentes diz Corrêa. Na General Osório, participei do projeto conceitual e fiz o elevador do Cantagalo. O elevador foi premiado pelo World Architecture Festival (WAF), em Barcelona, e pela Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA). Todos têm direito de opinar. Procuramos atuar em coerência com a cidade. Não é fácil fazer metrô no Brasil.

As seis estações da Linha 4, que ligará Ipanema à Barra, já têm o conceito definido. As entradas dos terminais nos 16 quilômetros do trajeto seguirão os mesmos contornos da Estação da Praça Nossa Senhora da Paz. A boca da Estação de Ipanema terá uma cobertura transparente, o que já é criticado por moradores. O estado diz que os projetos são de técnicos do governo, e a RioTrilhos não quis comentar as críticas aos projetos das entradas do metrô.



Enviado via iPhone

Comentários